O CÉU
Uma
nuvem passa pelo céu, apenas uma mancha em um semblante límpido e sereno de uma
manhã de outono. O céu contempla a existência terrena com sua calma superior,
refletindo silenciosamente sobre os atos daqueles cujos olhares eventualmente
se lhe dirigem.
Uma
leve brisa pode ser sentida, vinda de algum lugar distante. Sua fala é macia e
seu sussurro percorre os ouvidos dos que estão dispostos a escutar: “é chuva
que aí vem”. O céu continua impassível, a manhã passa despercebida e convida
gentilmente a tarde a aparecer.
A
tarde traz consigo o caloroso abraço do sol e o prenúncio da turbulência que se
anuncia no horizonte. O céu apresenta um semblante cansado que denuncia sua
idade. Olhos vermelhos e secos guardam lágrimas contidas e uma tristeza sem fim
por mais um dia cheio de erros da humanidade. Ciente disso, tenta esconder o
semblante com as mãos. Sua expressão se torna nebulosa e, lentamente, forma-se
uma lágrima na palma de sua mão. As nuvens não são o suficiente para esconder
sua desolação e a tarde, piedosa, convida a noite a trazer seu abraço de
escuridão.
Já
é possível chorar sem inibições e o céu enfim libera sua angústia. A princípio
seu pranto é silencioso e tímido, mas a compostura vai aos poucos desaparecendo
e se torna possível ver lampejos de sua fúria amargurada. Gotas já não são
suficientes para expressar a dor celestial e ele tenta desesperadamente
descarregar sua mágoa sobre a terra. O céu padece, mas a chuva limpa.
As
primeiras horas do novo dia trazem consigo esperança de renovação e o céu se
permite uma pausa. Sente-se exausto, mas também, de alguma forma, limpo, quase
como no dia em que nasceu.
Cansado,
tenta encontrar sossego nas estrelas, em busca de respostas para o que não se
pode perguntar apenas com palavras. Seu semblante é profundo e distante, mas
nem por isso indiferente, sendo, pelo contrário, tão intenso que traga os
desavisados para horas de contemplação.
O tempo passa e, vagarosamente, a
passos preguiçosos, o sol começa a anunciar sua presença. O céu – ciente de
tudo – se prepara para mais uma jornada, sem perder a esperança. Não que ele
tenha outra escolha.